sexta-feira, 30 de novembro de 2012





Decorreu ontem a segunda sessão do Clube de Leitura, que foi bastante animada e participada.

Aproveitando a presença de Mário Zambujal na Biblioteca Municipal, o livro do mês foi a última obra do autor "Cafuné". Os membros do clube puderam assim não só partilhar entre si as impressões deixadas pela leitura, como interagir com o próprio autor, ora fazendo comentários, ora questionando alguns aspetos da obra.

O autor explicou a sua tentativa de que que esta obra não fosse confundida com um romance histórico, apesar da obra tratar de um período específico da história de Portugal. Também também questiona se Cafuné poderá ser considerado um romance, pois segundo ele, pelos canones clássicos, a arquitectura do romance é bem mais complexa. 
Contudo, este livro obrigou o autor à consulta de trabalhos de investigação histórica e aos quais faz referencia logo no início da obra.

Cafuné passa-se no início dos século XIX, altura crítica das invasões francesas e da partida da família real para o Brasil. É na Lisboa de então, ainda convalescente do terramoto de 1755 que o leitor vai encontrar Rodrigo Favinhas Mendes, moço empolgado por encantos femininos, e Frei Urbino, um frade que se cansou do mosteiro, e também a Dália e a Lucrécia, damas participantes nas tropelias de Rodrigo.

Cafuné centra-se assim na figura de Rodrigo Favinhas Mendes, um bom malandro que não resiste aos encantos femininos e que se torna amigo de um ex-frade, Frei Urbino de Santiago, que acaba por ser o seu conselheiro e zelador espiritual. É que Rodrigo tem um coração gigante onde cabem muitas mulheres bonitas, dispostas a um carinho que ele é incapaz de recusar…

Mário Zambujal explica que como antigo jornalista passou à ficção para contar coisas que não aconteceram mas poderiam muito bem ter acontecido e pretendeu arquitectar uma história de crítica de costumes, vida e personagens urbanas, muito contemporâneas com um olhar de jornalista.


  

Sobre o autor:
Mário Zambujal, fez a sua estreia literária em 1980 com Crónica dos Bons Malandros a que se seguiram Histórias do Fim da Rua e À Noite Logo se Vê. Após um interregno, em que escreveu histórias para televisão, teatro e rádio, voltou aos livros com Fora de Mão, Primeiro as Senhoras, Já Não se Escrevem Cartas de Amor e Uma Noite Não São Dias e Dama de Espadas e em 2012 publica Cafuné. Presidente do Clube de Jornalistas, Mário Zambujal foi ainda jornalista de A Bola e de O Jornal, subchefe de redacção de O Diário de Lisboa, chefe de redacção de O Século, director-adjunto do Record, director do Mundo Desportivo e dos semanários Se7e e Tal & Qual, subdirector do Canal 2 da RTP e apresentador de diversos programas de televisão. 

sábado, 24 de novembro de 2012

LIVRO, JOSÉ LUÍS PEIXOTO

“A mãe pousou o livro nas mãos do filho.
Que mistério.”
Assim começa o romance. 
Este livro, deixado ao filho pela mãe, é o fio condutor que leva o leitor a entrar na ação e a desenvencilhar as linhas cruzadas que unem as vidas complexas das personagens, num país onde, entretanto, entrou a liberdade:
“25 de abril de 1974

Ao fim da manhã, enquanto ela recolhia a roupa do estendal da casa de banho, já seca, o Constantino entrou esbaforido a dizer que estava a rebentar um golpe em Lisboa. A Adelaide sentou-se num bordo da banheira, a ouvi-lo. Não o entendeu logo.”


Este livro percorre toda a primeira parte do romance e revela-se na segunda parte como sendo o Livro. E o mistério resolve-se para dar lugar a uma viagem pela Literatura universal. 

A ação decorre no mundo rural português da ditadura e o narrador, aparentemente heterodiegético, desnuda, de forma subtil e elegante, temas cruéis como o abandono de um filho: “Os olhos da mãe ficaram parados nos do filho até ao instante em que o seu corpo se virou e se afastou, regressando por onde tinha acabado de chegar.” (página 17); o trabalho infantil: “Havia quem atravessasse a vila para ver uma menina de onze anos a coser à máquina, cheia de desenvoltura.” (página 47); o incesto: “Quando aquilo começou a acontecer, ela não sabia do que se tratava, tinha onze anos e a mãe fazia-lhe pequenos vestidos para as colheres de pau. (…) Mais tarde, mais velha, quando aquilo estava a acontecer, ela facilitava os movimentos do pai, conhecia-os. (…) A mãe estava viva e, depois, a mãe morreu, nunca contariam a ninguém, e ele não parou. Ficou enjoada, ficou prenha, e ele não parou” (páginas 48/49); a gravidez precoce e o aborto: “Então, houve um momento em que toda a escuridão do quarto entrou dentro dela, encheu-a. Envelheceu. Quando o seu corpo rejeitou o que poderia ser uma criança e todo o seu sangue morto, a Lubélia ainda tinha dezassete anos, mas já era velha.” (página 79); a masturbação juvenil: “O Cosme tinha já as mãos dentro das ceroulas. Quando o Ilídio e o Galopim meteram também a mão dentro das ceroulas, houve um cheiro a transpiração, a pila mal lavada, que aqueceu o ar do barracão ligeiramente.” (página 31); a fuga para França: “Quase não se despediu da tia. A velha Lubélia estava a receber o calor do lume quando lhe bateram à porta. A Adelaide abriu e, na rua, no escuro, estava um homem parado a olhá-la. Quando lá chegares, escreve-me um postal.” (página 89); “ O que seria a França? A Adelaide sabia três coisas acerca do país para onde se dirigia” (página 105); o regresso dos emigrantes para passarem as “vacanças”: “Em chegados, o Cosme podia começar a queixar-se dos fogos ruges, das embutelhagens ou das auto-rutas. O pai dele mantinha um sorriso de não entender e o Cosme murmurava-me: É muito anciano, está próprio para toda a sorte de maladias.” (página 232) 

Livro é uma estória de culturas desencontradas. Emigrantes que partiram para França e querem regressar a Portugal. Filhos de emigrantes que nasceram em França e querem para lá voltar, rapidamente, quando estão de férias em Portugal. 

Livro é uma estória de amor, também ele desencontrado: “Se namorares comigo, dou-te um pombo, cem escudos e um livro.” (página 60); “Assim que chegou à França, escreveu uma carta ao Ilídio, Meu amor, não imaginas o quanto te quero bem, mas não recebeu resposta. Escreveu outra, Meu amor, estás zangado comigo?, mas também não recebeu resposta.” (página 143); “O Ilídio tinha esmorecido depois das cartas que escrevera à Adelaide e ao Josué.” (página 146) 

É um romance de escrita criativa, cheia de beleza: “Entrava uma estrada de luz pela porta aberta do barracão da palha. A tapada estava cheia de janeiro. Sem chuva, só a ameaça, o frio crescia dentro das pedras. Também as árvores eram feitas de frio até ao momento em que ardiam no lume e subiam pela chaminé de todas as casas da vila. A tapada cheirava a janeiro.” (página 31) 

E tem um final surpreendente. Daqueles que deixam o leitor a olhar para o livro e a perguntar-lhe: qual te vai substituir?


Livro, José Luís Peixoto, Quetzal, 3ª edição, outubro de 2010

terça-feira, 6 de novembro de 2012

LIVRO DE NOVEMBRO - Cafuné de Mário Zambujal


 Livro indicado: “Cafuné” de Mário Zambujal
Destinatários: público em geral
Data: 29 de novembro de 2012. A sessão coincidirá com a vinda do escritor à Biblioteca Municipal
Horário: 21h30