quarta-feira, 22 de abril de 2020

CLUBE DE LEITURA DE ABRIL

Com uma periodicidade mensal (à exceção de agosto), o Clube de Leitura destina-se a promover o prazer da leitura partilhada. As reuniões decorrem à volta de um livro previamente escolhido e lido por todos, proporcionando a convivência e a discussão entre quem gosta de ler e explorar os livros lidos, tornando a experiência da leitura ainda mais estimulante. Pontualmente poderá ter um escritor/dinamizador convidado.




Livro indicado: "O talentoso Mr. Ripley" de Patricia Highsmith

Data: Abril, 21h00 às 22h00

Sinopse: Patricia Highsmith é a grande criadora do romance policial psicológico e Tom Ripley é o personagem de referência da sua obra, um dos mais "negros" do policial do pós-guerra, "um homem que não reconhece a culpa em qualquer circunstância", segundo as palavras da escritora. Por isso ela lhe dedicou toda uma série de livros, que começa justamente com "O Talentoso Mr. Ripley" , mais uma vez adaptado ao cinema, agora pela câmara de Anthony Minghella. Aliás, a obra da autora desde cedo apaixonou os cineastas. O seu primeiro romance, "O Desconhecido do Norte-Expresso seria adaptado por Alfred Hitchcock.
Outros se lhe seguiram, fascinados por Ripley: René Clement e Wim Wenders. Ripley é um homem vulgar, que quer sair da América. A oportunidade surge quando o Sr. Greenleaf, seduzido por uma sua prestação ao piano, enganado por um casaco da Universidade de Harvard (Ripley é muito bom a imitar, a manipular, a disfarçar), o convence a ir à Europa e trazer-lhe de volta o filho, que vive em Itália uma dolce vita, com a mesada que o pai lhe manda todos os meses.
Ripley torna-se amigo de Dickie Greenleaf e da namorada deste, mas numa discussão violenta acaba por matá-lo e assumir a sua identidade. E a partir deste momento, o perigo, o inesperado, o medo, mas também uma frieza e um calculismo extremos perante a morte, passam a fazer parte do quotidiano de Ripley, que, no entanto, é capaz de se comover e nos comover, ao assistir a um espectáculo de ópera. 


Quem é Patricia Highsmith?


Patricia Highsmith (Fort Worth, Texas, 19 de Janeiro de 1921 - Locarno, Suíça, 4 de Fevereiro de 1995) foi uma escritora americana famosa pelos seus policiais e thrillers. Iniciou a carreira em 1940, a escrever roteiros de banda desenhada para a editora Nedor, sobretudo as do super-herói Black Terror. Tornou-se mundialmente famosa com Pacto Sinistro, que contou com várias adaptações para cinema, sendo a mais famosa dirigida por Alfred Hitchcock em 1951, e pela série com a personagem Thomas Ripley. Escreveu também muitas histórias curtas, frequentemente macabras, satíricas ou tingidas de humor negro.

Excertos da Graça Serra:



"O Talentosos Mr. Ripley" foi escrito por Patricia Highsmith em 1955 e é o primeiro livro de uma saga consagrada a Tom Ripley, a "Riplíada", formada por 5 livros:


1-The Talented Mr. Ripley (1955)
2-Ripley Under Ground (1970)
3-Ripley's Game (1974)
4-The boy who followed Ripley (1980)
5-Ripley Under Water (1991)

Nos 5 livros, Ripley comete homicídio 9 vezes e indiretamente causa 4 mortes adicionais. No 1º livro, O Talentoso Mr. Ripley, assassina Dickie Greenleaf e Freddie Miles.

Os 3 primeiros livros foram adaptados ao cinema.

O 1º, "O Talentoso Mr. Ripley", deu origem a 2 filmes:



 - "Plein Soleil", em 1960, com Alain Delon no papel de Ripley
 - "O Talentoso Mr. Ripley" (mesmo nome do livro), em 1999, com Matt Damon no papel de Ripley.



O 2º, "Ripley Under Ground", foi adaptado em 2005, com Barry Pepper no papel de Ripley.

O 3º também deu origem a 2 filmes:

-"The American Friend", em 1977, com Dennis Hopper no papel de Ripley.
-"O Jogo de Ripley" (mesmo nome do livro), em 2002, com John Malkovich. 

Como nasceu a ideia de Ripley?

Foi a própria Patricia Highsmith que contou, numa entrevista, como aconteceu.
Foi numa manhã, no verão de 1952, em Positano, Itália. A escritora (na altura com 31 anos) estava a viajar pela Europa com a namorada e albergou-se num hotel em Positano. De manhã acordou e veio até à varanda do quarto que dava sobre a praia. Foi quando viu "um jovem solitário de bermuda e sandálias, com uma toalha pendurada ao ombro, percorrendo a praia". Começou então a imaginar o que ia na sua mente mas só 2 anos mais tarde, quando iniciou o novo romance, deu vida ao seu anti-herói.      


pág. 29:

Chegou a Nápoles ao fim da tarde e só teria camioneta para Mongibello na manhã seguinte às onze.Um rapazola de mais ou menos 16 anos, de camisa suja  (...), agarrou-se a ele e, apesar dos protestos de Tom, entrou no táxi com ele e deu instruções precisas ao condutor para onde devia ir... até que finalmente o táxi parou diante de um grande hotel que dava para a baía. Tom teria ficado assustado com a imponência do hotel, se não fosse o Sr. Greenleaf a pagar as contas.
-Santa Lucía! - disse triunfalmente o rapaz apontando para o mar. 
(...)
Tom jantou nessa noite num restaurante sobre a água, chamado Zi'Teresa, que lhe fora recomendado pelo director do hotel. 
 
 






pág. 30


Apanhou a camioneta na manhã seguinte às onze. A estrada seguia a costa e atravessava pequenas cidades onde parava por momentos - Torre del Greco, Torre Anunciata, Castelammare, Sorrento. Tom escutava ansioso os nomes das localidades anunciadas pelo condutor. A partir de Sorrento a estrada era um estreito caminho cortado na rocha e sobre precipícios, tal como pudera observar nas fotografias dos Greenleaf. De vez em quando avistava pequenas aldeia à beira-mar, de casas brancas como pão amassado e pontos que eram de facto as cabeças das pessoas nadando junto à costa. Tom viu a rocha enorme que bloqueava a estrada e que devia ter caído da encosta. O condutor anunciou então com uma voz despreocupada:
-Mongibello!
(...)
Havia casas para cima, subindo a encosta, e para baixo, com os seus telhados de telha recortando-se contra o azul do mar. 



Podem acompanhar a viagem de Tom clicando no link para ver o mapa. Mas escusam de procurar Mongibello, que não existe. Foi inventada pela autora. Mongibello era no entanto o antigo nome dado ao vulcão Etna, na Sicília, talvez ela se tenha inspirado nele. No filme de Anthony Minghella, com o mesmo nome do livro, a turística aldeia de Positano, na Costa Amalfitana, foi usada para recriar este porto fictício de Mongibello.    






pág. 86/87

Alguns dias mais tarde partia para Paris de avião (...) Aterrou em Orly às cinco da tarde (...) Depois foi dar um passeio pela noite um tanto agreste e nevoenta de Dezembro (...) Comprou o Figaro, sentou-se numa mesa do Flore e pediu um fine à l'eau, pois Dickie dissera-lhe uma vez que era a sua bebida habitual em França. (...) Era maravilhoso estar sentado num famoso café e pensar no amanhã, no amanhã e no amanhã como sendo Dickie Greenleaf. 
  
O "Café de Flore" é um famoso café de Paris, que foi muito frequentado por escritores e artistas conhecidos, como Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir, Picasso e Hemingway, entre outros.


"Fine à l'eau" é o nome de uma bebida que já foi muito popular em França, nas décadas de 1920 a 1960: uma medida de conhaque, alongada com 3 medidas de água. No final dos anos sessenta o seu uso começou a declinar.

Há uma referência a esta bebida no livro "Casino Royale" de Ian Fleming. Quando conhece o agente francês René Mathis, James Bond manda vir para ele, no bar, um "fine à l'eau".

E também Hemingway  introduz esta bebida num dos seus livros, "The sun also rises" ("O sol nasce sempre", na tradução portuguesa), de 1926.


pág. 143:

[Tom] Teve uma ideia brilhante enquanto mudava de roupa: teria de ter um sobrescrito na sua posse, no qual devia estar escrito que não podia ser aberto antes de passarem tantos meses. Dentro deveria estar um testamento assinado por Dickie, deixando-lhe todo o seu dinheiro e rendimentos. Aquilo é que era uma ideia. 


pág. 147:

Depois de ter terminado a carta fizera mais um pouco de café e na Hermes de Dickie escrevera o testamento de Dickie, deixando-lhe todo o dinheiro e rendimento nos diversos bancos e assinara Herbert Richard Greenleaf, Júnior (...) Teria de correr o risco de apresentar um testamento sem testemunhas, pensou para si (...) e ouvira dizer que testamentos hológrafos não exigiam testemunhas. 

pág. 189:

[carta de Tom para o pai de Dickie]
Veneza, 3 de Junho, 19--
Caro Sr. Greenleaf
Quando estava hoje a fazer a minha mala, dei com um sobrescrito que Richard me deu em Roma e que eu, por qualquer misteriosa razão, esqueci completamente até este momento. Nele estava escrito "Para ser aberto apenas em Junho" e acontece por acaso que estamos de facto em Junho. O sobrescrito continha o testamento de Richard, em que ele me deixa todos os seus bens e rendimentos (...) incluo junto uma cópia do testamento para que o possam examinar aí. É o primeiro testamento que vejo na minha vida, pelo que sou perfeitamente desconhecedor dos trâmites a seguir. Que devo fazer?


pág. 198:

[carta do pai de Dickie para Tom]
9 de Junho, 19--
Caro Tom
(...) A minha esposa concorda comigo em que devemos respeitar as palavras e o espírito das vontades de Richard e o que quer que ele tenha feito com a sua vida. Portanto, pode contar no que toca ao testamento, com todo o meu apoio. Pus a fotocópia que me enviou nas mãos dos meus advogados, que o manterão informado dos progressos que forem sendo realizados na transferência dos bens e rendimentos de Dickie para si(...) 

Seria uma brincadeira? (...) Não era brincadeira nenhuma. Era tudo dele! A liberdade e o dinheiro de Dickie.  


Nunca tinha ouvido falar de testamentos hológrafos e fui ver o significado. 

Hológrafo: escrito, datado e assinado pela mão do testador.

A minha dúvida é se, como Tom diz, os testamentos hológrafos não exigem de facto testemunhas. Porque me parece tudo muito fácil: os pais de Dickie e os advogados não levantam qualquer objeção, não questionam a assinatura, nem pedem o testamento original, bastando-lhes a cópia.  

Peço à nossa advogada, Ana Ferreira, que nos esclareça com os seus conhecimentos. Isto é mesmo possível? Ou só na ficção? 



Há dois momentos em que Tom entoa esta canção popular italiana, uma tarantela. 

Primeiro momento, pág. 122:

[Tom chegou a Palermo e está a tomar um banho]...enquanto estava a tomar o seu banho quente e repousante naquela noite, espalhando a espuma sensualmente pelos braços (...) Mas o que é que ele dissera sobre os riscos? Eram os riscos que davam graça às coisas. E começou a cantar:
                 
                 Papa non vuole, Mama ne meno,
                 Come faremo far'l'amor?

A sua voz ecoou forte pela casa de banho, enquanto se secava. Cantava com a voz forte de barítono de Dickie, que nunca ouvira, de resto, mas tinha a certeza de que Dickie ficaria contente com o seu tom tão enérgico.


2º momento, pág. 184:

McCarron pagou a conta. 
- Muito obrigado pela sua ajuda, Sr. Ripley. Tenho já a sua morada e número de telefone, para o caso de ter de me encontrar outra vez consigo.
Levantaram-se.
-Importa-se que eu suba para me despedir de Marge  e do Sr. Greenleaf?  
Mc Carron não se importava. Voltaram a usar o elevador. Tom teve de se conter senão começava a assobiar. Papa Non Vuole ressoava alegremente na sua cabeça. 

Uma das versões mais conhecidas desta canção é cantada por Orietta Berti. No refrão, em vez de "papa" ela diz "babbo", que é um diminutivo de "papa". O título ora aparece "Papa non vuole", ora "Mama non vuole", ora ainda "Bella ragazza dalla treccia bionda", que é o primeiro verso da canção. Para dúvidas sobre a tradução, usem o tradutor do google. Não é perfeito mas ajuda.


Mando a letra (que também está no vídeo) para irem treinando em casa. Já que não podemos sair, podemos cantar (os passarinhos também cantam nas gaiolas). No dia do clube, tudo afinadinho para cantarmos "Papa non vuole". Se a Graça tiver na garrafeira da biblioteca um conhaque, antes preparamos um "Fine à l'eau" para aclarar as gargantas. 



Bella ragazza dalla treccia bionda,
i giovani per voi fanno la ronda
babbo non vuole, mamma nemmeno
come faremo a fare l’amor?
Babbo non vuole, mamma nemmeno
come faremo a fare l’amor?
Venir se voi volete nel giardino,
vi troverete o bella un gelsomino.
Babbo non vuole, mamma nemmeno,
come faremo a fare l’amor?
Babbo non vuole, mamma nemmeno
come faremo a fare l’amor.
Un gelsomino a voi v’ho regalare
in pegno del mio vero e grande amore.
Babbo non vuole, mamma nemmeno,
come faremo a fare l’amor?
Babbo non vuole, mamma nemmeno,
come faremo a fare l’amor?
Poi vi diro che rosa a primavera
non e quanto voi siete tanto cara.
Babbo non vuole, mamma nemmeno,
come faremo a fare l’amor?
Babbo non vuole, mamma nemmeno,
come faremo a fare l’amor?

E aqui, uma outra versão, talvez mais animada e popular, com o acordeão e a pandeireta. https://www.youtube.com/watch?v=MCcBqyV5teg
 
A propósito desta canção encontrei ainda uma curiosidade. A música de Tchaikovsky "Capricho Italiano", op. 45, tem uma parte igualzinha ao refrão desta canção (ouçam com atenção, ao minuto 3.20 e depois digam se é verdade ou não). Resta saber se foi Tchaikovsky que se inspirou na canção popular ou o contrário, se foi a canção que se inspirou no Tchaikovsky. Neste vídeo quem canta é o tenor Carlo Buti e a letra é ligeiramente diferente, parece que há muitas versões.






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