sexta-feira, 26 de março de 2021

CLUBE DE LEITURA MARÇO - 2021


No passado dia 25 de março, pelas 21h00, através do zoom, decorreu a sessão do Clube de Leitura para a abordagem da obra "Na memória dos rouxinóis" de Filipa Martins.

Trata-se do seu quarto romance, publicado em 2018 e que no ano seguinte recebeu o Prémio Literário Manuel de Boaventura, atribuído pelo Município de Esposende. Segundo Telma Cardoso, da ComUM, a Filipa pertence a “uma nova geração de escritores portugueses, que assumem as suas próprias revoluções: a luta pela imaginação, a independência face a correntes e ideologias, a vontade de cosmopolitismo, o direito à diferença da abordagem literária, a experiência da total liberdade e muito mais”.

Um romance extraordinário, feminino (embora sobre homens), em torno de um matemático que encomendou a sua biografia antes de morrer. Jorge Rousinol é um matemático galego, que sempre defendeu o esquecimento como o melhor veículo para a tomada de decisões acertadas. No final da vida encomenda uma biografia sua a uma casa editora. Estranha decisão para quem nunca quis recordar. O biógrafo escolhido acaba por ser alguém com quem privara décadas antes e que se vê, ele próprio, enleado em memórias moribundas.

É um romance em três tempos (o do passado do biografado, o do passado do biógrafo - e o do presente, que os une), que vê no arrependimento outra forma de se lidar com as recordações. Biógrafo e biografado conseguirão, em parte, o que pretendem: não se trata de esquecer, mas sim de escrever uma confissão. Uma escrita fantástica, inesperada, inovadora - de uma leveza surpreendente. Diálogos muito bem escritos, sensuais. Incursões pela magia dos números primos.

Filipa aborda a questão da memória e do esquecimento. Defende que a memória é o fio condutor da sua obra, aliada da humanidade, fazendo-nos recordar que "na 2ª Grande Guerra, se registaram 45 milhões de refugiados, mas apesar disso a Europa, "o continente que foi ajudado [nesse período],vira agora costas à ajuda" e tenta ignorar o percurso dos novos perseguidos.

Segundo a própria autora, é um romance disruptivo, pretende romper com os seus livros anteriormente publicados e criar algo singular. Através de uma linguagem rebuscada, escrita sensorial e delicada, deambulam um conjunto de personagens exóticas que exprimem ideias contraditórias e paradoxais, no entanto, com alguma coerência filosófica.

O leitor vai descobrindo, ora pela investigação do biógrafo Nino, ora pela mágoa do sobrinho Camilo, os acontecimentos da vida de um homem que quis suprimir a sua história, com três narrativas que possibilitam inúmeras hipóteses de condenação e redenção, como na vida de qualquer um de nós.

Filipa Martins intercala e permuta os tempos de uma forma excecional, levando cada um até ao fim, não terminando a narração de nenhum deles precocemente em relação aos restantes.

O romance é cativante por proporcionar a leitura de um tipo de escrita inovadora e surpreendentemente leve, todavia com uma sensualidade invulgar e despida de qualquer tipo de pudor. Os diálogos intrigantes e apaixonantes incitam no leitor o desejo da chegada do próximo momento de conversação das personagens.

Um convite à sua leitura.

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