No passado
dia 30 de abril, teve lugar a sessão do Clube de Leitura, para análise e
discussão do livro "Esse cabelo", primeira obra publicada pela angolana
Djaimilia Pereira de Almeida (1982- ).
Este livro
tem sido recomendado por grandes vultos da literatura nacional e lusófona como
Bruno Vieira Amaral, João Pinto Coelho, José Eduardo Agualusa, etc.. A sua segunda
obra "Luanda Lisboa Paraíso" recebeu o Prémio Literário Fundação
Inês de Castro 2018.
A jovem
autora escreve bem, numa linguagem heterogénea, umas vezes simples,
outras vezes pretensiosa, um pouco desarticulada, numa sintaxe fechada, o que
escurece o sentido do texto, obrigando o leitor, muitas vezes, a retroceder na
leitura para um melhor entendimento.
Trata-se de
um conjunto de memórias, nitidamente autobiográficas, numa busca constante
pela sua identidade, que retrata especialmente uma geração e uma época, não faltando
referências musicais e culturais contemporâneas.
O racismo, os
preconceitos, estão presentes em toda a obra e muito embora falar de
cabelos seja sempre encarada como uma futilidade, “Esse cabelo” é uma metáfora, cheia de simbolismos, que marcam
os ciclos da sua vida.
O 9º
capítulo é o mais belo e vem condensar toda a história “de uma menina que
aterrou despenteada aos três anos em Lisboa, vinda de Luanda, e das suas
memórias privadas ao longo do tempo, porque não somos sempre iguais aos nossos
retratos de infância; mas é também a história das origens do seu cabelo crespo,
cruzamento das vidas de um comerciante português no Congo, de um pescador
albino de M’banza Kongo, de católicas anciãs de Seia, de cristãos-novos maçons
de Castelo Branco - uma família que descreveu o caminho entre Portugal e Angola
ao longo de quatro gerações com um à-vontade de passageiro frequente. E, assim,
ao acompanharmos as aventuras deste cabelo crespo - curto, comprido, amado,
odiado, tantas vezes esquecido ou confundido com o abismo mental -, é também à
história indirecta da relação entre vários continentes - a uma geopolítica -
que inequivocamente assistimos”.
Parafraseando
Elena Ferrante, numa entrevista recente “Nunca
abandono um livro, mesmo que ele não me agrade, leio-o até à última linha.
Encontro sempre qualquer coisa para aprender. E entusiamo-me, talvez até de um
modo excessivo, quando um livro me surpreende favoravelmente."
No caso de “Esse cabelo” viajou-se no tempo e no
espaço, desta vez entre Luanda e Lisboa e por várias gerações. Regressamos também a 1957, aos
Arkansas, ao tempo racismo, da luta pelos Direitos Civis nos EUA e
de Elizabeth Eckford, vítima do ódio racial da multidão branca.
Este episódio simboliza uma "radiografia da sua alma", pois dentro dela, nos seus genes, encontram-se, simultaneamente, em conflito as vítimas do racismo e os supremacistas.
Embora relacione a sua "caminhada pacífica com a de Elizabeth, esse supremacista não cabe em nenhuma das definições conhecidas, embora subsista mesmo quando nada brame. Estava bem vivo no meu avô Castro, através do qual vociferava contra a "petralhada" do autocarro".
E a verdade é que nos dias de hoje ainda subsiste mesmo.
Quem nunca teve um pensamento ou exclamação supremacista?
Este episódio simboliza uma "radiografia da sua alma", pois dentro dela, nos seus genes, encontram-se, simultaneamente, em conflito as vítimas do racismo e os supremacistas.
Embora relacione a sua "caminhada pacífica com a de Elizabeth, esse supremacista não cabe em nenhuma das definições conhecidas, embora subsista mesmo quando nada brame. Estava bem vivo no meu avô Castro, através do qual vociferava contra a "petralhada" do autocarro".
E a verdade é que nos dias de hoje ainda subsiste mesmo.
Quem nunca teve um pensamento ou exclamação supremacista?
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