No
passado dia 26 de junho, pelas 21 horas, decorreu a sessão mensal do Clube de
Leitura da Biblioteca Municipal, para análise e debate da obra "Olhos
verdes" de Luísa Costa Gomes.
Trata-se
de um romance contemporâneo, com todos os aspetos da corrente pós-modernista,
dinâmico, inovador, interessante, irónico, cheio de humor e neologismos. Segundo
especialistas na matéria, tanto a construção das personagens como a técnica
narrativa está aprimoradíssima nesta obra.
Jorge
Listopad escreveu no Jornal de Letras a 24/ 5/ 82: “O que mais surpreende nas
páginas da jovem autora (...) é o modo de escrever. Tranquilo, com neutralidade
activa, mas neutralidade, o que não exclui um saber linguístico raro e
engenhosamente apaixonado. Mas além deste saber da escrita, opcional e tecnicamente
perfeita, há outro saber, o de contar".
Luísa
Costa Gomes escreve pelo prazer de escrever, sem preocupações em agradar aos
seus leitores, preferindo direcionar a sua escrita a leitores inteligentes,
reflexivos, exigindo-lhes alguma pesquisa muito para além do que nos oferece o
texto.
O
romance "Olhos verdes" já foi escrito em 1994, mas mantém uma
completa atualidade. As personagens são obcecadas pela imagem, pela aparência,
claramente psicóticas, contraditórias, bizarras.
Paulo
Levi, hipocondríaco, é modelo de roupa interior; Eva Simeão é "doida
varrida" e viciada em TV; o seu ex-marido, Paulo Mateus, deslumbrou-se com
a América, que é outro mundo; João Baptista Daniel, perseguido por Eva mas não
se interessando por esta, é diretor de marquetingue; Beatriz sua mulher, é
revisora gráfica; as irmãs Fonseca, Maria do Céu e Maria das Dores, oscilam
entre o esteticismo e o esoterismo; Ísis, amiga de Eva, dedica-se ao desaine;
Lourenço é fotógrafo; Anadir é a raínha dos jingles publicitários.
Com
este conjunto de personagens, que se entrecruzam casualmente e se evadem
da realidade, a autora apresenta-nos um retrato da sociedade contemporânea, com
a nítida ausência de valores, vazias, solitárias, narcisistas, sem ideia de um
sentido para a vida, centradas na cultura de massas, onde a banalização
das notícias transmitidas pelos meios de comunicação nos anestesiam e “já nada
daquilo que se vê eventualmente poderá fazer-nos sofrer ou fazer-nos felizes”.
Mas "as pessoas são capazes de suportar tudo, desde que o possam suportar
confortavelmente sentadas" e "o Bem vale mais que o Mal porque há de
menos. É a lei da oferta e da procura".
A
formação filosófica da autora transparece claramente no longo capítulo V,
dedicado a George Berkeley, filósofo britânico, do século 18, que tentou
demonstrar que a realidade material só existe na perceção que temos dela,
enquadrando a narrativa numa moldura teórica, no sentido de dar resposta às questões que
Eva Simeão coloca a João-Baptista "o que é isto que eu vejo? O que é
isto que eu
sinto? Deve haver uma ligação entre o que eu vejo e o que eu sinto. Mas o
que eu vejo deixa-me perplexa e intrigada, porque não sei ao certo o
que vejo. Verei exatamente o que estou a ver? Porque se assim é, então
não posso olhar mais. Não estou segura do que devo sentir. Será que
devia sentir alguma coisa?"
A
autora pertence à geração que frequentava a universidade quando o regime
salazarista foi derrubado, dando lugar ao aparecimento de uma nova sociedade,
com novas preocupações e novas sensações. Focando-se nessa nova sociedade
emergente, escreveu romances, teatro, contos, argumentos, etc.
Os
escritores de que mais a terão marcado foram Kafka e Beckett, em especial Nabokov.
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