quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

CLUBE DE LEITURA - DEZEMBRO 2020

Ontem, 16 de dezembro, pelas 21h horas, através do Zoom, decorreu mais uma sessão do Clube de Leitura.

A sessão foi dedicada ao Natal. Para isso foram selecionados, previamente, dois contos de uma antologia de Vasco Graças Moura, "Gloria in Excelsis: histórias portuguesas de Natal".

"Noite de Consoada" de Altino Tojal, transporta-nos para o mundo solitário das pessoas que não têm ninguém com quem vivenciar a noite de Natal, porque todos os seus entes queridos já partiram. Então, têm o "coração cheio de epitáfios".

Ao presenciarem a felicidade e a euforia dos outros, sentem-se "vagamente cão". 

As duas personagens do conto são almas gémeas na solidão e vagueiam juntas pela cidade em efervescência natalícia por "túneis de luz, ouvindo música de sinos" e "sentem-se cada vez mais cão".

Sem o mínimo calor humano, ceiam o que há, contentam-se com pouco e pensam no sapatinho. Lamentam-se e desabafam porque as suas famílias "não ligam nenhuma a festas" e já estão a dormir.

É um texto melancólico, escrito por alguém que certamente já se sentiu nesta condição, no entanto, com algum sarcasmo implícito. Texto curto, mas suficiente, muito frugal, parco, onde há silêncios, a tristeza do luto, terminando com o encontro das duas personagens bafejantes, com frio, no cemitério, junto dos familiares que já partiram e "dormem sono pegado".

A noite de consoada possível de dois seres a precisarem de ser consolados, mimados porque os natais estão cheios de epitáfios no coração dos homens, que nunca mais vão ter um Natal igual ao da infância com a família reunida porque muitos já partiram.

O 2º conto selecionado foi "A noite em que prenderam o Pai Natal" de José Eduardo Agualusa, de 1999.

É a história do velho Pascoal, "albino, pele de osga e piscos olhinhos cor-de-rosa, sempre escondidos por detrás de uns enormes óculos escuros".

Através da vida da personagem e da piscina da qual ele era o zelador, percorremos os acontecimentos políticos e sociais a seguir à descolonização de Angola, a todo o processo e degradação desse espaço de lazer até à sua completa destruição pela guerra civil. Guerra essa que "regressou com muita raiva", gerando a anarquia e uma delapidação ainda maior das riquezas desse país. Um verdadeiro "urbicídio"!

A função do Pascoal, era ser o Pai Natal, "ficar em frente ao supermercado, vestido com um pijama vermelho e de barrete na cabeça (...) Assim vestido, com um saco na mão, ele oferecia prendas às criancinhas (preservativos doados por uma organização governamental sueca ao Ministério da Saúde) e convidava os pais a entrar no loja.(...) O velho apreciava sobretudo o espanto dos meninos da rua. Faziam roda. Pediam licença para tocar no saco. Um, pequenino, fraquinho, segurou-lhe as calças.

- Paizinho Natal - implorou - me dá um balão".

Foi um natal especial para Pascoal, porque teve uma visão de uma senhora a sorrir, flutuando sobre o rubro das acácias, que o orientou para ele fazer o milagre das rosas, muito embora de plástico, "mas eram rosas"  para doar aos meninos pobres, "despardalados", da rua e fazê-los felizes na noite de natal.

Conto fantástico, de mestre! "Esse Agualusa goza de fininho..."

Também se sentiu falta dos encontros presenciais, da consoada do Clube com o arroz de pato. Sim, porque "o arroz é outra coisa", dos ovos verdes, da pavlova, dos brigadeiros, das rabanadas, dos diálogos cruzados, do carinho, dos miminhos a que nos habituamos a ter todos os anos.

Para o ano será melhor certamente. Esperemos. 

Altino Tojal (1939-2018)
José Eduardo Agualusa (1960-)




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